Daqui a alguns dias, os judeus de todo o mundo irão jejuar, prantear e orar pela destruição dos dois Templos Sagrados de Jerusalém e outros eventos que marcaram tragicamente nossa história.
O dia 10 de Tevêt no calendário judaico marca o início do cerco de Jerusalém pelos exércitos do imperador da Babilônia, Nabucodonosor, que levou à conquista da cidade, à destruição do Templo Sagrado e à expulsão do povo de Israel de sua terra.
"Devido ao ódio infundado entre os judeus" – conclui o Talmud – "Jerusalém foi destruída." Por quê – perguntou o Lubavitcher Rebe – o Talmud insiste em dizer que o ódio era "infundado"? Não havia motivos, tanto ideológicos quanto pragmáticos, para as divisões entre os judeus? Mas nenhuma razão, disse o Rebe, é motivo suficiente para o ódio. A mutualidade de nosso destino é muito mais profunda que qualquer possível causa para animosidade. Todo ódio, então, é infundado.
Portanto, se o "ódio infundado" foi a causa da destruição, continua o Rebe, seu remédio é o "amor infundado" – nossa redescoberta da unidade intrínseca que supera todos os motivos para a discórdia e os conflitos.
Ore por Jerusalém, encoraje e ajude seus defensores, e demonstre amor ao próximo judeu – não importa o quanto ele ou ela seja diferente de você. Pois se existe uma virtude redentora em estar sitiado, é a oportunidade de perceber que estamos juntos nisso tudo.
Segundo o Sêfer Yetzirá, cada mês do ano judaico tem uma letra do alfabeto hebraico, um signo do Zodíaco, uma das doze tribos de Israel, um sentido e um membro controlador do corpo que correspondem a ele.
Tevêt é o décimo dos doze meses do calendário judaico.
Tevêt começa com o "período" (tekufá) do inverno (cujos três meses – Tevêt, Shevat e Adar – correspondem às três tribos do acampamento de Dan – Dan, Asher e Naftali – situadas no lado norte do acampamento).
Tevêt começa com os últimos dias de Chanucá (que tem seu ponto culminante no oitavo dia – Zot Chanucá). Seu décimo dia – o décimo dia do décimo mês ("o décimo será sagrado para D’us") – é um dia de jejum, em comemoração ao cerco de Jerusalém, o início da destruição do Templo.
Os quatro dias de jejum que comemoram a destruição do Templo são (por ordem de ano): 17 de Tamuz (o 4º mês), 9 de Av (o 5º mês), 3 de Tishrei (o 7º mês), e 10 de Tevêt (o 10º mês). Destes quatro dias (em seus respectivos meses) diz o profeta: "O jejum do quarto [mês] e o jejum do quinto, e o jejum do sétimo, e o jejum do décimo [no futuro] serão para a Casa de Yehuda júbilo, felicidade e dias festivos."
A soma dos quatro números – 4, 5, 7 e 10 – é 26, o valor do inefável Nome de misericórdia de D’us, Havayá (os quatro dias dos quatro meses são 17 [de Tamuz], 9 [de Av], 3 [de Tishrei], e 10 [de Tevêt].
17 mais 9 = 26; 3 mais 10 = 13, o valor da palavra echad ["um"].
26 e 13 são portanto o valor numérico de Havayá echad ["Havayá é um"].
26 mais 13 = 39. 26 [o valor dos meses] mais 39 [o valor dos dias] = 65 = Adnut).
Os quatro números possuem uma progressão numérica ordenada, com diferenças finitas de 1, 2, 3. Os seguintes três números na progressão – 14, 19, 25 – totalizam 58 – chen ("graça").
Juntamente com 26 – Havayá – os primeiros sete números da progressão ("todos os setes são queridos") totalizam Chanoch (cujo nome, da palavra para "educação" e "iniciação", é um acrônimo para "a graça de Havayá", a sétima ("querido") querida geração a partir de Adam.
Todos os dias de jejum, quando observados corretamente, atraem a graça Divina da suprema fonte de misericórdia, o Nome Havayá de D’us. A epítome desse processo (na ordem do ano, como nas palavras do profeta acima citado) está em Dez de Tevêt (no segredo do "fim [último dia de jejum do ano] está encravado no início [dos eventos que levam à destruição]"). Pela Divina graça, o terceiro, eterno Templo, é construído, primeiro no coração de Israel, para depois se tornar fisicamente manifesto na terra.
Letra: ayin
A letra ayin significa "olho". O mês de Tevêt é o mês da retificação e anulação do "olho mau". A própria palavra Tevêt vem de tov, "bom", referindo-se a tov ayin, "o olho bom" (a fonte de poder da bênção, como está escrito: "o olho bom abençoará"). Esta retificação começa quando eles são completados no oitavo dia).
Todo o processo destrutivo começa com o "olho mau" do ódio, o ódio do profano para com o sagrado (o segredo de dez, o número sagrado, como foi mencionado acima). Do ódio vem a ira, o fogo da destruição. A letra do meio de ka'as, "ira", é a letra ayin. O ka'as negativo deve primeiro ser retificado a seu correspondente positivo, como será explicado agora.
Mazal: "gedi" (Capricórnio – cabra)
Nossos Sábios nos ensinam que aos dez anos de idade (uma alusão ao décimo mês, o nível de dez em geral) uma criança "pula como um cabrito." (Midrash Kohêlet) A natureza lúdica de saltar para cima e para baixo "como um cabrito" reflete um estágio importante no processo de crescimento. O mês de Tevêt, o mês da tribo de Dan, tem relação com o processo de crescimento, de um estado de imaturidade a um estado de maturidade.
A imaturidade é caracterizada pelo "olho mau", ao passo que a maturidade, pelo "olho bom". gedi = 17 = tov, "bom" ("o olho bom"). Deve-se brincar (e saltar como um cabrito) a fim de retificar e suavizar a ira latente na alma animalesca.
Tribo: Dan
A tribo de Dan representa o estado inicial de imaturidade na alma que "cresce" durante o mês de Tevêt. Dan significa "julgar". Inicialmente, ele julga a realidade e os outros criticamente, com julgamento severo ("o olho mau"). Esta é a natureza de alguém espiritualmente imaturo. Dan é comparado a uma serpente, que morde com o veneno da ira. O "olho mau" é o olho da serpente.
A retificação de Dan é seu engajamento na batalha da ira sagrada contra a ira do mal. Nossos Sábios nos ensinam que somente alguém originário da alma-raiz de Dan pode pular espontaneamente e matar a serpente má – "alguém como ele, matou-o".
Nachash ("serpente") = 358 = Mashiach. O poder sagrado de Dan reflete uma centelha de Mashiach. No Zôhar, aprendemos que o comandante-em-chefe do exército de Mashiach virá da tribo de Dan.
Sentido: Ira (ka'as ou rogez)
O sentido da sagrada ira (a retificação do mês de Tevêt) é a capacidade da alma de despertar a própria boa inclinação e enfurecer-se pela má inclinação. Isso Nossos Sábios nos ensinam em seu comentário sobre o versículo em Tehilim: "Enfureça-se e não peque."
A ira positiva expressa o profundo cuidado e preocupação da alma que a realidade torna boa. Embora mesmo nessa ira exista um certo elemento de imaturidade (pois maturidade absoluta, aquela do Criador da realidade, vê [com o ayin de Tevêt (tudo como bom), apesar disso, sobre isso se afirma: "pois Israel é [comporta-se como] um rapaz, e [portanto] Eu [D’us] o amo."
Na Chassidut aprendemos que a pessoa deve dirigir seu olho esquerdo (mau) para si mesma (com a sagrada ira de seu bem inato contra seu mal inato), para rebaixar e subjugar seu ego, enquanto simultaneamente dirige seu olho direito (bom) para a realidade exterior (por cujo poder ele ajuda a realidade a aperfeiçoar-se).
Controlador: fígado (kaved)
Nossos Sábios ensinam que "o fígado é furioso". A função do fígado é purificar o sangue com o qual está saturado. Na Cabalá, o fígado corresponde à serpente primordial, cuja retificação é personificada por Dan. (Os três "governantes" do corpo e alma são o cérebro, o coração e o fígado, que correspondem a Adam, Eva e a serpente, respectivamente).
A serpente, na Cabalá, representa o estado inicial de imaturidade da alma, como caracterizado pelo atributo não retificado da ira. O veneno da serpente é quente (veja acima, o mês de Cheshvan), como o fogo da ira. Quando convertido para o bem, o fogo (e o sangue do fígado) servem para aquecer o mês frio de Tevêt.
Kaved = 26 = Havayá. Isso reflete o segredo mencionado acima, que a soma dos quatro meses que "jejuam" pela destruição do Templo (pelo veneno da serpente primordial), que culminam em Tevêt, juntos totalizam 26. Ao jejuar pela destruição, a pessoa retifica seu fígado – suaviza a própria ira – e portanto "adoça" a ira de D’us (com Israel, a causa da destruição) e desperta a misericórdia de Havayá para reconstruir o Templo.
baseado nos ensinamentos do Lubavitcher Rebe.
Quem escreveu o seguinte?
"Mashiach restaurará o reino de David à sua glória antiga, à sua soberania original. Ele reconstruirá o Templo Sagrado e reunirá os dispersos de Israel. Em todos os tempos, todas as leis [da Torá] serão reafirmadas como outrora; sacrifícios serão oferecidos, e os ano Sabático e Jubileu serão instituídos conforme delineados na Torá. Aquele que não acreditar nele ou que não antecipar sua vinda, nega não apenas os outros profetas como também a Torá e Moshê…"
Quem disse estas palavras? Um sacerdote exilado que sobreviveu à destruição do Templo? Um místico safediano do século dezesseis? O Lubavitcher Rebe?
Lembro-me de uma discussão que tive certa vez sobre a questão de um futuro Templo. O indivíduo com quem eu debatia alegava haver diferentes opiniões sobre isso no judaísmo clássico. Os rabinos "da direita," naturalmente, são a favor. Mas e quanto a um filósofo esclarecido como Maimônides?
Ele não diria que embora o Templo possa ter sido um componente necessário da vida religiosa no clima cultural daqueles tempos, é um anacronismo no mundo de hoje? (Meu amigo estava se referindo a uma passagem da obra de Maimônides, Guia para os Perplexos, que podia ser entendida desta maneira.)
Como resposta, peguei o 14º Livro da Mishnê Torá da estante e mostrei a ele o parágrafo acima citado, escrito pelo próprio Maimônides há mais de oito séculos, onde ele declara sem sombra de dúvida que a reconstrução do Templo Sagrado é parte integral da futura redenção, pela qual os judeus rezam e antecipam a cada dia de sua vida.
O dia 10 de Tevêt pelo calendário judaico é o aniversário do cerco a Jerusalém, que levou à destruição do Templo Sagrado 30 meses depois. Neste dia, judeus do mundo inteiro jejuam e pranteiam pela destruição do Templo, rezando pela sua reconstrução. Portanto, esta é uma boa ocasião para perguntar: Por que precisamos de um Templo? Do que, exatamente, precisamos?
A raça humana tem aprendido muito no decorrer dos últimos 6000 anos. Filosofamos um caminho até a ciência, e então a ciência nos guiou pelo portal do misticismo. Ao longo do caminho, inventamos a literatura, arte, amor romântico, economia, democracia e psicologia. Mas ainda não sabemos como viver nossa vida.
Coloque vinte pessoas em um sala. É bastante provável que haverá uma concordância unânime sobre a santidade da vida, direitos humanos, igualdade, livre arbítrio, paz mundial e outros. Mas deixe-os sair da sala para lidarem com sua vida do dia-a-dia, e você terá vinte opiniões diferentes sobre o significado de todas aquelas coisas, e como elas deveriam ser aplicadas.
Ao lutar com as opções diárias que a vida nos apresenta, os próprios princípios com os quais concordamos tornam-se a base para opiniões conflitantes e ações a respeito de tudo, desde aborto até suicídio assistido. A confusão vai desde perfil racial e vegetarianismo até preces nas escolas, e praticamente todos os assuntos com os quais nos confrontamos.
Idéias e princípios não são o suficiente. Eles definem o quadro geral, mas poucos conflitos são sobre o quadro geral. A maioria das discórdias e dilemas são sobre o como, o quando e o onde. Não basta saber o que é correto — precisamos ter profundo conhecimento da integridade, para entender suas variações e sutilezas seus gostos e parcialidades.
É como a diferença entre alguém nos mostrar a foto de uma pessoa e ser casado com ela por vinte anos. No primeiro caso, tenho um rosto e um nome: se eu encontrar aquela pessoa na rua, saberia quem é ela. Mas eu sei como ela gosta de seu café? Sei que tamanho de sapato usa, ou de quantas horas de sono precisa? Sei como sorri ao ser elogiada ou como reage quando é ofendida?
Não basta saber que A é bom e que B é mau, que X está certo e que Y está errado. Precisamos ver a bondade de perto — perto o bastante para discernirmos os detalhes. Precisamos viver com a integridade, casar com ela, senti-la em nossos ossos. Precisamos um relacionamento íntimo com D’us.
Até certo ponto, é possível atingir este relacionamento íntimo no mundo atual. Temos a Torá, na qual D’us colocou Sua alma e personalidade, Suas aspirações e idiossincrasias, Seus gostos e aversões. A Torá nos dá um guia para a vida que é tanto espiritual quanto prático, respondendo à nossa ânsia pela intimidade com o Divino, enquanto governa nossa conduta através do mundo físico.
Mas o problema é que a Torá é um documento escrito. Então, o que você diz a alguém que fala: "Eu, também, tenho a Torá, e minha tradição tem uma interpretação diferente da sua sobre o que é certo e errado"? E como podemos, nós mesmos, ter certeza de que entendemos todas as nuanças da maneira certa e o texto escrito está sendo perfeitamente aplicado a nossas vidas? Se apenas houvesse um lugar onde a bondade e a retidão realmente vivessem! Um lugar com um endereço e número de telefone. Um local onde possamos ir fisicamente e levar nossos primos e vizinhos. Olhem, diríamos, aqui está a verdade, ali está a bondade, esta é a justiça, estão vendo? E eles veriam.
Este local existiu: o Templo Sagrado em Jerusalém, a morada de D’us no mundo físico. É disso que precisamos.
Entre os jejuns de nosso calendário, o jejum do dia 10 do mês de Tevet recorda o dia em que Nevuchadnetsar, rei da Babilônia, iniciou o cerco da cidade de Jerusalém aproximadamente 2500 anos atrás. Aparentemente, um cerco não é tão trágico como os eventos pelos quais os outros dias de jejum foram instituídos. Durante o cerco, a cidade, propriamente dita, permaneceu intacta, o Templo Sagrado continuou a funcionar e até os sacrifícios continuaram sendo ofertados, como de costume.
Em contraste, no dia 17 de Tamuz o serviço diário dos sacrifícios foi interrompido e os muros da cidade foram realmente rompidos e em 9 de Av, O Templo Sagrado foi destruído. O começo do cerco em 10 de Tevet certamente não pode ser comparado em tragédia a estes eventos. Entretanto, o jejum de 10 de Tevet, diferentemente de outros jejuns, não é adiado para outro dia se cair no Shabat. A severidade adicional deve-se ao fato de o cerco de Jerusalém não ter sido apenas um acontecimento independente, mas a raiz de todas as calamidades subsequentes. Ele levou à tragédia de que o "muro foi arrombado" em 17 de Tamuz, e o Templo Sagrado, moradia de D'us, queimado em 9 de Av.
Embora o rei da Babilônia ainda não tivesse derrubado os muros, o simples fato de ter cercado Jerusalém, e como resultado "a assediado", por si só é uma catástrofe que deve ser combatida. A falta de arrependimento do povo judeu causou todas as calamidades posteriores, por este motivo este dia deve evocar um sentido mais profundo da teshuvá do que os outros jejuns.
A teshuvá, retorno, tem a propriedade singular de não só fazer com que transgressões passadas sejam perdoadas, mas de transformá-las em méritos. Isto se iguala ao conteúdo da promessa de D'us: "...o jejum do quarto (mês - Tamuz)...e o jejum do décimo (mês - Tevet) deverão se tornar dias de alegria, júbilo e festividades para a casa de Yehudá." No futuro, na Era Messiânica, os jejuns não penas serão abolidos, como serão transformados em festividades. A equação é clara: através da teshuvá, ajudamos a eliminar a causa desses jejuns, e os transformamos em dias de festa e alegria.
Outros cercos
Nevuchadnetsar não foi o primeiro rei a assediar Jerusalém. Sancheriv, rei da Assíria, protagonizou o mesmo antes dele e a ameaça era em escala muito maior. Apesar da enorme supremacia das forças de Sancheriv, D'us fez um milagre e numa noite apenas destruiu totalmente o exército assírio. Isso foi o resultado das orações de um único homem, Chizkiyáhu, rei de Yehudá, naquela época. Foi uma extraordinária vitória para a nação judaica.
Há outro exemplo. Antes de D'us trazer o Dilúvio sobre a Terra, deu à humanidade um aviso prévio de cento e vinte anos. O Criador ao ver que não houve arrependimento durante todo este tempo, deu-lhes mais uma chance no último momento. Mesmo após o início das chuvas, se o povo tivesse se arrependido, o dilúvio teria se transformado em chuvas de bênçãos.
Uma corrente de eventos semelhantes poderia ter ocorrido no tempo de Nevuchadnetsar se os judeus tivessem aproveitado a oportunidade. Arrependimento apropriado e estimulado pelo cerco poderiam ter transformado uma tragédia em potencial, em uma vitória positiva e extraordinária.
O judeu já deveria ter aprendido a lição, e é para isto que existe o jejum de 10 de Tevet; o cerco é positivo e realmente existe para bons propósitos, se soubermos aproveitar a chance: fortalecer os muros da Jerusalém existente dentro de cada um.
O significado de Jerusalém - Habitação de Paz.
Jerusalém, Yerushaláyim, em hebraico é derivado da palavra Yir'á, temor a D'us e Shalem, integridade ou perfeição. Assim, Jerusalém representa temor perfeito ou completo dos Céus. Dentro de cada judeu encontra-se Jerusalém, um nível da alma onde nada reside além do temor a D'us. Não há dúvidas, nem hesitações, em se entregar à Divindade. A diferença entre o bem e o mal é claramente delineada.
Babilônia, Bavêl, em hebraico, está relacionada com a palavra Bilbul, que significa mistura, confusão. Bavêl corresponde ao mundo e suas nações, onde o sagrado, o mundano e o proibido estão todos misturados e é difícil diferenciá-los. O rei da Babilônia representa o Yetsêr Hará, a má inclinação.
Em 10 de Tevet, quando o rei da Babilônia cercou Jerusalém, marca a data da tentativa do Yetsêr Hará em conseguir atingir seu intento: a aproximação para obscurecer a distinção entre o sagrado e o profano. Não se trata aqui de um convite ao mal, mas muito pior; um disfarce na tentativa de estabelecer proximidade.
Um judeu deve saber que Jerusalém e Babilônia jamais podem se misturar. São mundos diferentes sem qualquer relação entre si. Jerusalém representa a Divindade total. Babilônia é a confusão que conduz ao mal. Uma distinção clara deve sempre ser mantida: "Ele faz uma distinção entre o sagrado e o profano, entre a luz e as trevas e entre Israel e as outras nações" (texto da Havdalá, cerimônia realizada ao término do Shabat).
Conservar a nossa Jerusalém interior inviolada é uma tarefa difícil. Vivemos no exílio onde há trevas que fazem com que a confusão esteja presente por toda a parte, especialmente nos tempos que precedem à chegada de Mashiach, quando os sinais desta era, conforme descritos pelo Talmud, estão plenamente evidentes. Como poderá o judeu proteger-se de ser cercado; e ainda mais difícil, resguardar-se do desespero? A resposta é encontrada no próprio cerco de 10 de Tevet. Não somente um judeu não é afetado pelo cerco, mas leva a batalha até o inimigo através da conquista da Babilônia.
Babilônia simboliza o mundo. Jerusalém simboliza o temor dos Céus. O serviço de um judeu no início de seu dia inicia-se com "Modê Ani", oração e estudo da Torá, associando-se desta forma ao temor dos Céus, Yerushaláyim. Depois, a pessoa vai trabalhar e fica envolvida em assuntos mundanos, a Babilônia.
Aprendemos que um judeu deve saber que em essência ele não tem ligação com a Babilônia. O judeu consegue discernir que o sucesso nos assuntos mundanos é devido somente às bênçãos de D'us, no estudo da Torá, seu guia de vida, e na prática das mitsvot, seus preceitos. Através do serviço a D'us, o judeu eleva a Babilônia, o mundo, até o nível de Jerusalém, a santidade, não permitindo sua destruição e transformando o mundo em um lugar adequado para a morada de D'us conforme as palavras dos nossos sábios (Yalcut Shimoni, Yeshayáhu 247): "No futuro, Jerusalém abarcará todos os países" - todas as terras, incluindo a Babilônia, estarão no nível de Jerusalém.
Em Jerusalém, a sensação humana esporádica, porém universal, de sonhar sem poder interpretar o sonho, é mais forte que em qualquer outro lugar, e ainda mais desde que a cidade realmente existe. Mas é assim que a pessoa se sente quando no exílio. Pois o exílio é uma espécie de sonho. Quando o Tehilim afirma que, ao retornar, "seremos como sonhadores" (Tehilim 126:1), significa que será como se estivéssemos despertando de um pesadelo.
O sentimento de que estamos vagando em um sonho inexplicado torna-se muito mais forte quanto maior a freqüência do sonho. A Lei Judaica analisa perfeitamente esse ponto. Afirma que quando vemos Jerusalém pela primeira vez, devemos rasgar nossas roupas devido ao luto, e quando vemos as ruínas do Templo, devemos rasgá-las novamente.
Pois a Jerusalém de hoje não é a verdadeira Jerusalém de nossos sonhos e nossas ânsias. Falamos tanto sobre "retorno" em nossa liturgia e nossa poesia porque uma profunda crise ocorreu com nosso exílio de Jerusalém. Não somente fomos expulsos de nosso lar, como também a Shechiná, a presença de D'us, exilou-se de nós. Poder-se-ia pensar que isso afeta somente aos judeus; afinal, foi o Templo judaico e sua capital a serem destruídos, primeiro em 423 AEC e depois em 70 EC. Mas na realidade, com este exílio o mundo inteiro está em crise, porque a presença de D'us afeta a todos, assim como Sua ausência.
A ausência de D'us - a ocultação de D'us, segundo a Cabalá - tem desestabilizado profundamente o mundo. Quando D'us voltar a Jerusalém, o mundo todo recuperará sua estabilidade. E assim nossas três preces diárias para D'us reconstruir Jerusalém na verdade significam "Ponha o mundo de volta em seu lugar."
Um exemplo simples expressa bem este conceito. Todos nós usamos artefatos eletrônicos. Se removermos as pilhas, nada funciona; quando as recolocamos, tudo trabalha perfeitamente outra vez. Quando dizemos: "Que Jerusalém seja reconstruída!" estamos pedindo a D'us para renovar nossa conexão - para colocar as pilhas! - para que tudo comece a funcionar novamente. Voltar a Sion não é uma questão de geografia, mas de conexão. Restabelecer esta conexão colocará o mundo outra vez no lugar.
Vimos portanto que a ressurreição de Jerusalém deverá ocorrer em dois planos - espiritual e material. A respeito de ruas e casas, é fácil reconstruir Jerusalém. Porém reconstruí-la adequadamente significa corpo e alma - seus edifícios, ruas, água e árvores, e internamente. Como declarou o Rei Salomão: "Vi servos sobre cavalos, e príncipes caminhando como servos em cima do chão" (Cohêlet 10:7). Desordem interna é uma das definições de exílio, e quando a ordem correta não é respeitada, nada é realmente construído. Embora a cidade possa parecer real, é apenas uma construção imaginária. Daí vêm nossos sentimentos de estarmos vivendo em um sonho, mesmo quando estamos lá.
Então, como pode Jerusalém ser verdadeiramente reconstruída? Nossa liturgia nos dá algumas pistas. Antes de mais nada, não podemos falar sobre Jerusalém sem falarmos de amor, nos sentimentos de Israel pela Cidade Sagrada, mas também na maneira pela qual o retorno deve acontecer. Quando dizemos em nossa prece diária: "A Jerusalém, Tua cidade, com compaixão retornaste" expressamos nosso desejo para que o retorno seja suave. Pois como nos relembra Yechezkel, poderia também ser catastrófico - "Eu te governarei com uma mão poderosa... e com ira transbordante, como uma tempestade pode criar uma montanha." (Yechezkel 20:33)
Eis por que Jerusalém é sempre uma história de amor, como vemos em grande parte de nossa liturgia e também na poesia. O grande poeta espanhol Yehudá Halevi chama Jerusalém de "plenitude de beleza" e afirma que toda a perfeição está unida dentro dela. Em outra canção de amor, Lecha Dodi - "Venha, minha amada" - que cantamos para dar as boas vindas ao Shabat, Jerusalém é comparada a uma noiva, enfeitada com adornos, esperando nosso retorno.
Nossa volta a Jerusalém deve ser também uma verdadeira reunião, e não apenas um encontro. Jerusalém é uma cidade muito sensível - uma cidade de paz, mas também um local fervilhante de ódio, devido ao constante risco de contenda, que infelizmente sobreviveu até os dias de hoje! Esta irritação brota da hipersensibilidade da cidade. Jerusalém é como o lugar onde todos os nervos se juntam. Quando você o toca, tudo começa a estremecer.
Lidar com uma área sensível exige delicadeza especial. Devemos ser cuidadosos lá, com a cidade e uns com os outros. Daí a máxima talmúdica: "Aqueles que nasceram em Jerusalém receberão uma recompensa especial, mas aqueles que amam Jerusalém também a receberão," e o versículo de Yeshayáhu (66:10), "Rejubile-se com Jerusalém... todos os que a amam."
Terceiro, a verdadeira reconstrução de Jerusalém implica na reconstrução do Templo. Há uma progressão. Primeiro, D'us novamente habitará Jerusalém; depois, reconstruiremos Sua casa e O serviremos lá. Talvez isso seja por que Yeshayáhu compara Jerusalém e Israel a uma mulher triste, abandonada pelo marido: antes de mais nada, volta para casa! Depois disso, veremos.
Então mais uma vez, a mulher abandonada pode ser nós mesmos: quando a esposa abandonada sai para um passeio, quando ela está em algum outro lugar, ela sente menos a ausência do marido. Sente-se mais forte ao voltar para casa. E assim nosso anelo é maior talvez quando estamos fisicamente na cidade mas a Shechiná ainda não está. A cidade de ouro ornamentada em sua luz incomparável faz-nos ansiar ainda mais pela Sagrada Fonte da luz.
Desde o sonho de Yaacov até o presente, Jerusalém sempre esteve entre o Céu e a Terra, um lugar onde o sublime está em constante contato com o mundano. Por um lado, as pessoas cospem no chão; por outro, vivem como se estivessem em um perpétuo sonho. Ambos os aspectos são reais; nenhum deles conta toda a história. Pois agora, vivemos no exílio e rezamos, uma vez mais, pelo retorno.
Rabino Adin Even Israel Steinsaltz foi aclamado pela revista Time como "Um erudito fora de série". Mais de dois milhões de cópias de seu Talmud Steinsaltz (Random House) foram vendidas em todo o mundo. É um erudito residente em Yale e Princeton, e em 1988 foi agraciado com o Prêmio Israel, a mais alta honraria do país.
Copilado e com algumas adaptações para melhor entendimento.
Rev. Elimar Gomes-Alves
Facebook: @egalves7
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Twitter: @prelimargomes
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